Como enfrentar decisões judiciais de aplicação impossível no caso concreto – a nova interpretação trazida pela Análise Econômica do Direito | por Marina Moratti

A Análise Econômica do Direito é uma disciplina inicialmente desenvolvida pelo common law, que pretende utilizar teorias e métodos advindos da ciência econômica para examinar o impacto social da estrutura jurídica adotada pelo Estado. Pretende-se, deste modo, responder a questões como, qual é o impacto das normas jurídicas no comportamento dos indivíduos e instituições e qual abordagem do direito traria maior bem-estar social.

Apesar de o Direito e a Economia apresentarem, em princípio, natureza incompatível entre si, ao passo que uma disciplina busca primordialmente a justiça e a segunda a eficiência das relações entre agentes econômicos, a análise das normas jurídicas, que passa por ambas perspectivas, resulta em soluções mais adequadas aos conflitos sociais.

A disciplina, que se tornou relevante internacionalmente, foi explicitamente inserida no ordenamento jurídico brasileiro em abril de 2018 com a modificação introduzida pela Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) – Lei nº 13.655/18. A referida alteração instituiu critérios objetivos para aplicação do direito ao caso concreto em seus diversos ramos, visando obter soluções eficientes. Deste modo, para se adequar aos novos paradigmas, é necessário:

  1. o exame das consequências práticas da decisão adotada;
  2. a abordagem
    1. da necessidade de intervenção judicial no caso concreto;
    2. da eficácia da decisão para solução do problema trazido ao judiciário;
    3. da impossibilidade de adoção de medidas menos gravosas ou onerosas às partes.

Estabelecendo-se as referidas diretrizes, busca-se evitar decisões de cumprimento impossível; que adotem medidas mais onerosas quando for possível a solução por outros meios; e que, de modo geral, ofereçam respostas eficientes às questões trazidas à análise do judiciário.

Os operadores do direito vivem cotidianamente os efeitos práticos de decisões cuja aplicação, se não impossível, oneram demasiadamente as partes ou mesmo a própria sociedade. Os contratos de adesão, e o tratamento conferido às relações de consumo de modo mais amplo, é um dos exemplos mais evidentes do comprometimento do bem-estar social em prol da noção de justiça adotada pelo ordenamento jurídico brasileiro.

Decisões judiciais, a exemplo, frequentemente ampliam a cobertura de contratos, anulam suas cláusulas e, efetivamente, desfiguram instrumentos contratuais, visando a proteção ao consumidor. Contudo, o que, em regra, não se leva em consideração é o custo social que tal postura provoca.

Apesar de norteadas pela justiça, propósito do Direito, tais decisões compõem o custo da empresa, refletindo diretamente no valor do produto oferecido ao consumidor final. Instala-se assim o inevitável cenário em que, ao contrário de oferecer a proteção pretendida, a decisão que corrompeu um contrato perfeito, sem vício de forma ou de vontade, em nome da justiça, tão somente levará à redução do bem-estar social pelo aumento do preço.

Neste sentido, há de se considerar que apesar de tido como hipossuficiente, o consumidor é agente econômico capaz e racional, sopesando, por tanto, suas escolhas com base no grau de utilidade e ônus decorrente de sua decisão.

Apesar de constantemente antagonizados, os contratos de adesão oferecem diversas vantagens à fornecedores e consumidores, sendo, de fato, um dos instrumentos que permitiram a ampliação das atividades econômicas, com um custo mais baixo de operação. A elaboração de contratos individuais onera as relações jurídicas, afetando a eficiência, agilidade e custo das relações sociais.

Outro exemplo de violação aos critérios estabelecidos pela Análise Econômica do Direito é a aplicação de multa por descumprimento de decisões judiciais astreintes, quando sua inobservância não se der pela vontade da parte.

As astreintes têm por objetivo compelir a parte em mora a cumprir obrigação imposta por decisão judicial. Não têm, por finalidade, portanto, indenizar a parte lesada ou punir a desobediência do condenado à obrigação de fazer.

Apesar de, em regra, o descumprimento da decisão se dar por inércia da parte, há situações em que a satisfação da obrigação independe da sua vontade. Neste sentido, a ausência de documentos que são exigidos por órgãos públicos, prazos fixados por cartórios superiores àquele fixado em decisão judicial, são alguns exemplos que podem ser citados.

O cumprimento de decisões desta estirpe fica prejudicado por fatores externos à vontade da parte, de modo que, por mais onerosa que a relação se torne, não será possível compeli-lo ao cumprimento, o que, reitera-se, é o propósito da aplicação das astreintes. Verifica-se, então, que a aplicação de multa por descumprimento se torna absolutamente inócua, não solucionando o obstáculo ao cumprimento da decisão.

Forçoso concluir, então, que a decisão é ineficiente. Apesar de proporcionar um falso sentimento de justiça, à medida que o condenado é onerado pelo descumprimento, a natureza do instituto foi corrompida, deixando de cumprir o fim a que se propõe.

Estas são algumas situações rotineiras enfrentadas ao traduzir o direito em soluções ao conflito social trazido à apreciação do poder judiciário. Sua aplicação ineficaz onera as relações jurídicas e reduzem o bem-estar social. A Análise Econômica do Direito oferece então instrumentos, aos seus operadores, para buscar decisões não somente justas, mas também eficientes.

Marina Moratti

(31) 3261-8083

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